As 22 múmias foram levadas ao Museu Nacional da Civilização Egípcia, onde serão exibidas. O transporte das peças foi realizado em cápsulas com nitrogênio, para garantir preservação. As pessoas acompanharam nas ruas, pela TV e pela internet
No Egito, o governo preparou um grande desfile impressionante para transferir os sarcófagos de 22 faraós de um museu a outro.
Há mais de três mil anos os egípcios não cortejavam faraós. As TVs do Egito chamavam a população para esse momento havia meses. O governo egípcio cogitou transferir as 22 múmias com cautela, sem alarde. A opção foi pela pompa e circunstância.
A Orquestra do Egito foi a trilha sonora da última jornada de 18 reis e quatro rainhas. Eles deixaram para trás o Museu Egípcio, na capital Cairo; escoltados pela carruagem, por ordem cronológica.
O faraó Seqenenre Taa, do século 16 antes de Cristo (a.C.), abriu o desfile. É a múmia mais velha do grupo, mas não a mais famosa. Ramsés II reinou por 67 anos e assinou o primeiro tratado de paz já conhecido.
Neste sábado (3) quem garantiu a paz foram os batedores. Mas o principal risco no trajeto de cinco quilômetros era o sacolejo de múmias tão antigas. Os organizadores usaram carros com amortecedores especiais. Os faraós ficaram em cápsulas cheias de nitrogênio para conservação.
Milênios atrás a técnica de embalsamento era outra. Os primeiros métodos envolviam o corpo com faixas apertadas de linho ensopadas com resina, sais, ervas, óleos, ceras. Para conservar melhor o corpo, os sacerdotes retiravam todos os órgãos, menos o coração, considerado o lugar da inteligência.
E ele bateu forte várias vezes ao longo do Desfile de Ouro dos Faraós. Luzes, faixas, músicas. As pessoas acompanharam nas ruas, pela TV e pela internet a sua História.
O Egito experimentou um forte aumento de infecções por Covid-19 há um ano. Mas os casos de contágio e mortes foram caindo. O governo acha que está livre de mais uma praga e agora permite as reuniões.
Os 22 reis e rainhas também já tomaram decisões polêmicas. Hoje, com um discreto sorriso nos sarcófagos, pareciam gostar de uma renovada bajulação.
A carreata durou perto de uma hora. O presidente recebeu os antigos governantes no novo Museu Nacional da Civilização Egípcia, que passa a funcionar integralmente neste domingo (4). Abdel-Fattah al-Sisi inaugurou uma obra faraônica.
As múmias foram descobertas em 1871 no Vale dos Reis e desde o começo do século passado estavam em salas apertadas no Museu Egípcio. Agora, a antiguidade ganhou um controle moderno de temperatura e umidade, com projeções que lembram os túmulos subterrâneos.
O Egito teve uma aula em tempo real. Viajou de volta para o universo dos papiros, hieróglifos e outros artefatos de uma das mais importantes civilizações humanas.
A transferência dos faraós não aconteceu sem polêmicas. As múmias do Egito são historicamente associadas a maldições. No túmulo do faraó de Tut, haveria um aviso: “a morte virá em asas rápidas para aqueles que perturbam a paz do rei”. Muitos supersticiosos enxergaram uma relação entre o desfile e um acidente de trem com dezenas de mortos; o desabamento de um prédio com 18 mortes e, claro, o navio que atolou no Canal de Suez, parando parte do comércio marítimo entre Ásia e Europa.
A professora Salima Ikram, da Universidade Americana do Cairo, explica que o desfile ajuda o povo a “se envolver com o próprio passado”. Ela lembra que esses são os reis do Egito e têm uma importância histórica e econômica para atrair turismo.
Os egípcios antigos faziam mumificações porque acreditavam que a pessoa precisava do corpo na vida eterna. E é nos museus que eles alcançam aquilo que queriam: a eternidade.
JN